QUEIMADURAS

QUEIMADURAS

DOENÇAS E TRATAMENTOS

  Tupam Editores

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Quando se fala de queimaduras pensa-se automaticamente em calor e em pele. O calor, porém, não é a principal causa de queimaduras, nem a pele é o único órgão afetado.

A pele é o revestimento externo do corpo, funciona como capa protetora e constitui o maior e mais pesado órgão do corpo humano. Com cerca de 2 metros quadrados de extensão, no adulto médio representa aproximadamente 15 por cento do peso do corpo e é constituída por três camadas – a epiderme, a derme e a hipoderme.

Para além da sua função protetora contra as agressões do meio externo, desempenha diversas outras funções complexas como a regulação de líquidos, termorregulação, sensibilidade e adaptação metabólica. Quando é destruída por queimadura, o seu normal funcionamento fica afetado tornando o indivíduo vulnerável, não só pela elevada perda de líquidos devido à rutura dos vasos mas também pelo risco de infeção, por perda da pele enquanto barreira.

Queimaduras são lesões produzidas nos tecidos orgânicos devido à ação do calor nas suas diversas formas, independentemente de ser através de radiação ou por contacto direto.

Existem vários agentes causais para as queimaduras que se incluem em quatro grupos principais: queimaduras térmicas, as mais frequentes, provocadas pelo contacto com uma fonte de calor intenso, que pode ser uma chama, líquido a ferver ou um corpo sólido incandescente; queimaduras químicas, produzidas pelo contacto com ácidos (ex. ácido clorídrico) ou bases (ex. soda cáustica, lixívia); queimaduras elétricas, provocadas pelo calor gerado à passagem de uma corrente elétrica através dos tecidos orgânicos; e queimaduras por radiação, provocadas pela transferência de radiação para o corpo, sendo a mais comum a radiação solar.

Associado a estes tipos de queimadura, pode também ocorrer a queimadura inalatória, classificada como lesão causada por calor, em consequência da inalação de monóxido de carbono ou fumos.

A gravidade de uma queimadura está diretamente relacionada com fatores como a sua etiologia – natureza, intensidade e duração da exposição ao agente causal.

A natureza da substância que provoca a queimadura pode constituir fator relevante de agravamento, aumentando em função do tempo de contacto; a localização da lesão por queimadura, em zonas como a face, mãos, pés, genitais ou pulmões, pode torná-la mais grave.

Também a extensão, ou seja, a superfície corporal total "SCT" afetada, é muito importante que seja quantificada, por influenciar decisivamente a forma de atuação dos técnicos de saúde na avaliação do nível de gravidade da queimadura.

Para este cálculo são utilizadas principalmente duas formas, o método de Lundt e Browder ou a regra dos nove de Wallace e Pulaski, esta última mais rápida e expedita.

Entre os pacientes adultos, a mais utilizada é a regra de Wallace, baseada na divisão da superfície do corpo em múltiplas áreas, representando cerca de 9 por cento do total, usando o seguinte critério: a cabeça, face e pescoço, 9 por cento; cada membro superior, 9 por cento; cada membro inferior, 18 por cento (9 por cento na parte anterior e 9 por cento na posterior); a parte anterior e posterior do tronco 18 por cento cada; a zona genital, um por cento.

No que respeita à gravidade da queimadura, fatores como a idade (as crianças e os idosos têm risco mais elevado de complicações) e os antecedentes pessoais, tais como a história clínica da pessoa afetada (diabetes, tensão arterial alta, doenças renais ou respiratórias), podem agravar ainda mais a situação.

A somar a este conjunto de fatores, é de grande relevância a profundidade da queimadura. Quanto mais camadas da pele são afetadas, mais demorado será o processo de cicatrização e o aumento dos riscos envolventes.

Classificação das queimaduras e complicações

É possível distinguir vários graus de queimaduras em função da profundidade das lesões. As queimaduras de primeiro grau são as que apenas afetam a epiderme, a camada superficial da pele. Como originam uma intensa vasodilatação, manifestam-se através de vermelhidão cutânea (eritema), um pequeno edema na zona e, por vezes, ardor ou até dor, que aumenta ao mínimo contacto.

O epitélio alterado vai-se descarnando ao longo das 24 a 48 horas seguintes após a produção do acidente. As lesões costumam sarar completamente ao fim de três ou quatro dias sem deixar cicatrizes ou outras sequelas.

As queimaduras de segundo grau podem ser classificadas em superficiais ou profundas. As superficiais comprometem parcialmente a derme, apresentando-se muito dolorosas, com superfície rosada, húmida e com presença de bolhas ou vesículos cheios de líquido (flictenas). Tendem a cicatrizar em até três semanas, sendo raras as cicatrizes hipertróficas.

As profundas afetam a camada reticular da derme e, neste caso, a pele atingida apresenta-se seca, com coloração rosa-pálido e dor moderada. Cicatrizam normalmente de 3 a 9 semanas, sendo comum a formação de cicatrizes inestéticas.

As queimaduras de terceiro grau afetam todas as camadas da pele, ultrapassando a epiderme e a derme, alcançando a hipoderme e, eventualmente, os tecidos subjacentes, como músculos e ossos. As zonas afetadas evidenciam-se através de camadas duras de cor esbranquiçada que, em seguida, tendem a exibir uma tonalidade escura (escaras) ou áreas carbonizadas de cor negra.

Estas queimaduras não provocam dor, dada a destruição das terminações nervosas sensitivas. Como a regeneração cutânea depende do crescimento do epitélio da periferia, a cura pode levar muito tempo, meses ou anos, e não chegar até a completar-se espontaneamente, sendo necessário o recurso a implante cutâneo. Como este tipo de queimaduras, mesmo as que saram espontaneamente, deixam cicatrizes residuais, retráteis e deformantes, deve ponderar-se sobre a conveniência de se proceder a implante cutâneo.

As queimaduras de primeiro grau têm uma evolução favorável, não são dolorosas nem originam complicações significativas, tendendo a desaparecer sem deixar sequelas. Já as de segundo grau e, sobretudo, as de terceiro, mais profundas, para além das sequelas estéticas e funcionais que podem provocar nas zonas atingidas devido à formação de cicatrizes, podem originar várias complicações, entre as quais é possível destacar duas, dada a sua frequência e gravidade: a infeção e, quando extensas, o choque hipovolémico.

Existe perigo de infeção em todas as queimaduras de segundo e terceiro grau, independentemente da sua extensão, pois representam uma via de acesso para os microrganismos que eventualmente entrem em contacto com a área lesionada. Além disso, os tecidos enfraquecidos constituem um meio favorável para a proliferação microbiana.

As queimaduras extensas podem também desencadear um quadro de choque, uma vez que a ação do calor provoca a desnaturalização das proteínas plasmáticas, o aumento da permeabilidade dos vasos sanguíneos e a saída maciça de líquido plasmático. A ação direta do calor sobre os glóbulos vermelhos, nas queimaduras extensas, podem ainda provocar a sua destruição maciça com o consequente quadro de anemia.

O desfecho final, nas vítimas de queimadura, melhorou dramaticamente nos últimos vinte anos, mas as queimaduras ainda causam morbilidade e mortalidade substanciais.

Todos os anos há em Portugal mais de 1500 acidentes com queimados. Destes, as crianças representam, em mais de 500 dos casos, situações com elevada taxa de mortalidade.

A avaliação e o tratamento adequados ajudam imenso na minimização do sofrimento e na otimização dos resultados.

Tratamento e adaptação à nova realidade

O tratamento do paciente queimado evoluiu muito nas últimas décadas. Um melhor conhecimento da fisiopatologia da queimadura, o desenvolvimento de agentes antimicrobianos tópicos, suporte nutricional, a excisão tangencial e o uso de matrizes de regeneração dérmica e outros substitutos cutâneos mudaram o prognóstico destes pacientes.

A maioria das queimaduras ocorridas no dia-a-dia, principalmente devido a acidentes domésticos, é ligeira e cura-se com medidas simples, sem necessidade de assistência profissional. Porém, as queimaduras graves necessitam de atenção médica, ainda que sejam pequenas, mas profundas, e de urgência, quando extensas, por poderem originar complicações pondo a vida em risco. O comportamento adotado nos momentos posteriores ao acidente pode favorecer o prognóstico da evolução das lesões e o risco de a vítima poder vir a falecer.

Nas queimaduras pouco profundas e de dimensões reduzidas o tratamento imediato baseia-se na aplicação de frio e administração de analgésicos para atenuar a dor. A seguir deve proceder-se à limpeza e desinfeção da zona danificada com o fim de evitar a sua contaminação e prevenir a infeção. Posteriormente, o tratamento é semelhante ao de qualquer ferida ligeira.

Nas queimaduras profundas, mesmo de pequenas dimensões, principalmente quando afetarem zonas delicadas, é necessário a intervenção de um profissional que avalie as características e decida a terapêutica mais apropriada pois embora, por vezes, seja necessário reparar-se a ferida através da remoção dos tecidos enfraquecidos, outros casos haverá em que a cura da ferida necessita da realização de transplante cutâneo.

Em caso de queimaduras graves extensas, a prioridade inicial é vigiar o estado geral da vítima. Só depois deve proceder-se ao tratamento local das lesões, sendo muitas vezes necessário recorrer-se à transfusão de plasma e controlar, com rigor, as funções vitais. A terapêutica costuma ser efetuada em unidades hospitalares especializadas, constituídas por um corpo médico capacitado e equipamento apropriado para efetuar vigilância rigorosa do estado geral da vítima e se aplicar um tratamento local das lesões que favoreça a regeneração espontânea dos tecidos ou, quando for oportuno, se proceda à realização de transplante cutâneo.

O tratamento das queimaduras consiste na aplicação de pensos diários ou em dias alternados, em que são substituídos os pensos, as ligaduras e o produto a aplicar. Estes tratamentos podem ser realizados sob efeito de analgésicos, ajustados ao nível de dor do doente, sob efeito de anestesia geral, ou através da combinação de sedativos e analgésicos, uma vez que a dor está presente em todas as fases da queimadura, desde o acidente ao pós-alta. As sessões de fisioterapia e cirurgia reconstrutiva são as etapas seguintes para recuperar fisicamente.

A vítima de queimadura grave sofre uma transformação na sua aparência, que lhe exige uma nova adaptação, novas perceções, conceitos e imagem de si mesmo. Ao aperceber-se das alterações na sua aparência e suas implicações, o doente experimenta tristeza, ansiedade, vergonha face ao corpo e medo de rejeição. Surgem os sentimentos de inferioridade, ou mesmo de falta de competência, culpabilização e revolta, que podem levar ao isolamento e depressão grave.

O paciente passa por uma fase em que se recusa a abordar o problema, evitando olhar-se ao espelho ou para o corpo. A seguir passa por um período de ajustamento ao estilo de vida normal, incorporando as suas alterações e a nova imagem corporal no seu autoconceito. Este é o primeiro passo para o seu regresso à vida social, considerada pela maioria dos doentes como uma das fases de maior stress após o internamento hospitalar.

Entre os vários aspetos que dificultam a reintegração social – assim designada por se tratar de uma aprendizagem de vivências sob o olhar dos outros – destacam-se a própria aceitação das suas alterações físicas e a curiosidade humana de olhar para o que é diferente.

Esta reintegração passa pelo regresso ao trabalho, ao seio familiar e aos contactos sociais comuns. O regresso ao emprego pode ser dificultado pelo tipo de alterações sofridas. Quanto mais visíveis as áreas lesadas, como por exemplo as mãos e a face (cartões de visita sociais), mais expostos ficam os doentes a olhares, comentários, questões e até mesmo a alterações profissionais, dependendo das funções desempenhadas.

O adulto com vida de casal também sente grandes alterações na sua aceitação e, muitas vezes, na entrega ao outro, escondendo os seus receios e afastando-se.

Esta etapa da reintegração social deve ser sempre feita com o apoio das pessoas próximas do paciente e acompanhada por técnicos de saúde, que despistem situações patológicas de adaptação.

Prevenir para evitar o acidente

Os acidentes que envolvem queimaduras deixam inúmeras sequelas permanentes, expõem os doentes a tratamentos dolorosos e demorados, e marcam as suas vidas de modo irreversível.

A prevenção é a melhor forma de combater as queimaduras, uma vez que são resultado de um acidente, o que torna possível evitá-lo. Existem vários tipos de acidentes domésticos, aos quais todos estamos expostos, por falta de informação ou por alguma atitude mais negligente.

Para que o meio onde vivemos se torne mais seguro é necessário apenas o seguimento de algumas medidas simples de proteção, tais como:

evitar a ligação de vários aparelhos na mesma tomada de corrente – existe risco de sobrecarga elétrica e, consequentemente, de curto-circuito ou mesmo incêndio;

instalações elétricas improvisadas são perigosas. Fios descarnados e sem adequada proteção nas extremidades, potenciam choque elétrico;

quando se pretende reparar uma instalação elétrica, ou simplesmente substituir uma lâmpada, como medida de segurança, o quadro geral deve ser desligado;

não deixar junto a fontes de calor (lareira, aquecedor, radiador...) substâncias facilmente inflamáveis;

desligar os transformadores de corrente elétrica das tomadas, quando não estiverem a recarregar aparelhos;

nunca utilizar produtos inflamáveis como o álcool, acendalha líquida ou gasolina, para acender as lareiras ou grelhadores de churrasco;

na cozinha, utilizar as panelas de pressão de acordo com as instruções, não as abrindo quando sob pressão, ter atenção ao chão molhado e não usar água para extinguir incêndios no fogão provocados por alimentos ou óleo, usando uma tampa para eliminar o oxigénio;

não utilizar químicos, como, por exemplo, a soda cáustica, na limpeza doméstica.

Sobretudo não esquecer, nunca! Para evitar que o acidente aconteça, redobrar a atenção e os cuidados.

Autor:
Tupam Editores

Última revisão:
09 de Abril de 2024

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