Nova via imune lança luz sobre a esclerose lateral amiotrófica
Apesar de existirem no mercado medicamentos para retardar a progressão das doenças neurodegenerativas, ainda não há cura. Uma equipa de investigadores do Hospital Infantil de Boston e da Escola de Medicina de Harvard estão à procura de novos caminhos para retardar a disfunção neuronal e tratar a esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma doença fatal do neurónio motor.

MEDICINA E MEDICAMENTOS
NEUROCIÊNCIAS
As neurociências nasceram da vontade e da necessidade de o Homem saber mais sobre um dos órgãos mais importantes do organismo, resultando da interacção entre várias áreas do saber. LER MAIS
Os especialistas descobriram que as proteínas envolvidas no sistema imunológico inato podem estar na raiz da doença. O estudo, publicado recentemente na revista Neuron, permitiu constatar que a inativação de uma molécula no cérebro ligada à inflamação previne danos celulares em neurónios humanos e retarda a progressão da ELA em ratinhos.
Quando as células reconhecem o perigo, como uma infeção, moléculas imunes são ativadas para soar um alarme que recruta e ativa células imunes para o local da lesão para a tentar eliminar e planear a reparação do tecido. Às vezes, a resposta imune envolve uma família de proteínas chamadas gasderminas, que provocam a morte das células através de um processo altamente inflamatório chamado piroptose. Um tipo de gasdermina, a gasdermina E, é mais expressa no cérebro nas células nervosas, mas não se sabia o que fazia.
A equipa de investigação, liderada pela Dra. Judy Lieberman e por Isaac Chiu, examinou pela primeira vez como a gasdermina E afeta os neurónios. Para isso os especialistas desenvolveram modelos de neurónios de ratinhos e de amostras humanas e analisaram os efeitos da gasdermina E nos axónios, ou as partes dos neurónios que enviam sinais elétricos.
Descobriram, então, que quando os neurónios detetam um perigo, a gasdermina E causa danos à central elétrica da célula, conhecida como mitocôndria, e aos axónios. Os axónios degeneram, mas as células não morrem.
Quando se olha para uma placa de neurónios, vê-se uma selva de axónios, mas ao olhar para uma placa onde a gasdermina E é ativada observam-se retrações desses processos celulares. Essa retração acontece nos nervos dos músculos de pacientes com ELA.
Para entender melhor a relação entre a gasdermina E e a neurodegeneração, a equipa criou modelos de neurónios motores de ELA, transformando amostras de células-tronco de pacientes com ELA em neurónios. Os investigadores descobriram que a gasdermina E está presente em níveis elevados nesses neurónios. E eles poderiam proteger os axónios e as mitocôndrias de danos ao silenciar a gasdermina E.
A seguir, a equipa pretendia testar se os efeitos vistos nas células se poderiam traduzir em melhorias nos sintomas relacionados com a neurodegeneração. Então, silenciaram a gasdermina E num modelo de ratinho com ELA e, ao fazê-lo, descobriram que isso atrasou a progressão dos sintomas e levou a neurónios motores protegidos, axónios mais longos e menos inflamação geral.
Estes resultados sugerem que a gasdermina E leva a alterações nos neurónios que podem contribuir para a progressão da doença.
Embora alguns medicamentos possam bloquear os efeitos de outras gasderminas, ainda não está claro se a gasdermina E pode ser alvo de medicamentos, ainda assim, este trabalho é um primeiro passo importante para o desenvolvimento de novas abordagens para o tratamento da ELA.