ERROS EM MEDICINA, ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO

ERROS EM MEDICINA, ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO

MEDICINA E MEDICAMENTOS

  Tupam Editores

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Os erros em medicina ocorrem em todos os locais e implicam todos os tipos de actos, desde falhas de diagnóstico, passando pelos efeitos adversos dos fármacos, até aos procedimentos administrativos, e quase nunca resultam de uma acção individualizada, pois existem sempre razões subjacentes ao sistema.

Os mais comuns advêm da falta de comunicação, da má-interpretação de caligrafias, da confusão entre os vários nomes de medicamentos, como por exemplo o médico que prescreve 260 mg de Taxol e o farmacêutico prepara 260 mg de Taxotere – e de desconhecimento.

Deste modo, uma das definições de erro médico mais adoptadas é: "acto que, através da ignorância, deficiência ou acidente, se afasta ou falha em conseguir o que deveria ter sido feito".

Desde a publicação, em 1999, de To Err is Human: Building a Safer Health System, pelo Instituto de Medicina norte-americano, que o mundo tem vindo a tomar consciência dos erros em medicina e, consequentemente, instituições como a Food and Drug Administration (FDA) e a Agência Europeia do Medicamento (EMEA), têm vindo a adoptar estratégias dentro das várias áreas que constituem o sistema de sáude de modo a evitá-los.

O erro médico nos Estados Unidos

A nível laboratorial, o trabalho das entidades reguladoras consiste na aprovação de nomes para medicamentos o mais díspares possíveis no sentido de minimizar a semelhança entre eles, evitando, assim, possíveis confusões.

Para tornar esta tarefa mais eficaz, a FDA está a criar um programa para ajudar na detecção de nomes similares.

Já na fase de pós-comercialização, de cada vez que a mesma instituição detecta uma confusão de nomenclatura, é enviada informação aos profissionais de saúde, acompanhada de algumas recomendações para evitar mais erros.

Apesar de não ser habitual, a FDA pode, igualmente, alterar o nome do produto depois de este já estar disponível no mercado – a última vez que o fez foi em 1994, com o fármaco Levoxine, indicado para a tiróide, que estava a ser confundido com Lanoxin, indicado para o coração, que havia passado a designar-se por Levoxyl.

A nível hospitalar, a FDA fez uma proposta no sentido de que fossem utilizados códigos de barras em determinadas substâncias e produtos biológicos, como por exemplo vacinas, sangue e seus componentes e produtos OTC utilizados nos hospitais.

Os profissionais de saúde passariam a utilizar um scanner, semelhante ao usado nos supermercados, para se certificarem de que estavam a administrar o fármaco certo, na dose certa ao paciente certo. Os hospitais dos Veterans Affairs (VA) adoptaram esta tecnologia nos seus hospitais e os resultados foram um sucesso.

Nestes hospitais, assim que o doente entra é-lhe colocada uma pulseira com um código de barras que transmite informação para o computador central. As enfermeiras utilizam o scanner para verificar qual a medicação a ser administrada.

Com recurso a esta tecnologia, o VA Medical Center, em Topeka, num período de monitorização de nove anos, sofreu uma redução de erros na medicação de 86%.

Um projecto-piloto desenvolvido pelo Hospital Fairview Southdale tornou-se permanente depois de se ter revelado um sucesso.

O projecto tinha como objectivo assegurar que os pacientes submetidos a intervenções continuassem a tomar os seus medicamentos regularmente aquando da sua entrada no hospital. Deste modo, o hospital pediu para os farmacêuticos de serviço telefonarem aos doentes uns dias antes da sua intervenção e para anotarem o seu historial completo de toma de medicamentos. Em seguida, estes profissionais reviram a informação com o cirurgião que decidia quais os medicamentos que o doente devia continuar a tomar. Decorridos três meses, a redução do número de erros por paciente rondou os 84%.

Estudos desenvolvidos pelo ISMP (Institute for Safe Medication Practices) descobriu que o programa informático Computerized Physician Order Entry (CPOE) é igualmente eficaz na redução de erros na medicação, uma vez que as ordens de prescrição de medicamentos são introduzidas no computador em vez de serem escritas ou ditadas oralmente, não existindo, desta forma, margem para má interpretação de caligrafias, dosagens ou abreviaturas.

Em 2001, 3% dos hospitais norte-americanos tinham implementado este programa, mas a tendência era para cada vez mais unidades adoptarem esta tecnologia.

Uma outra das áreas de extrema importância é a área do utente. Um utente informado é um elemento fundamental na detecção de erros.

Segundo o presidente do ISMP, instituto dedicado à prevenção de erros médicos, espera-se que o sistema de saúde mantenha os utentes seguros, porém existem, igualmente medidas que estes podem tomar para cuidar de si e da sua família. Deste modo, todas as instituições aconselham o paciente a perguntar ao seu médico, enfermeiro – durante uma estadia hospitalar – sobre o medicamento que vão tomar, qual o seu nome, para o que é, como o tomar, quais os possíveis efeitos secundários e o que fazer para os atenuar.

O paciente quando sair do consultório não deverá ter nenhuma dúvida sobre estes tópicos. O mesmo deverá vigorar no caso de o paciente ser submetido a uma intervenção.

O utente deverá igualmente fazer uma lista e informar o seu médico dos fármacos que está a tomar, incluindo os OTC, suplementos alimentares, ervas medicinais e outras substâncias para minimizar o risco de ocorrência de interacções medicamentosas prejudiciais ao paciente, devendo estar sempre actualizada.

Antes de tomar os fármacos, o paciente deverá sempre ler o Folheto Informativo (FI).

Segundo um estudo de mercado realizado em 2002, muitos dos utentes descuravam informações importantes presentes nos folhetos informativos dos produtos OTC, uma vez que eram de difícil compreensão.

Para minimizar a ocorrência de erros nestes casos, a FDA tomou medidas no sentido de ajudar os utentes a usar os produtos OTC de uma forma mais consciente.

Já em 2000, a FDA tinha proposto um novo formato para melhorar o manuseamento do Resumo das Características do Medicamento (RCM) por parte os médicos.

O erro médico no seio da União Europeia

O primeiro estudo europeu sobre o erro médico, cujos resultados foram divulgados em 2006, baseado em 29.154 entrevistas a europeus dos 25 estados-membros, países candidatos e em fase de adesão, revelou que apesar de as opiniões sobre o erro médico divergirem de estado-membro para estado-membro, este é um problema que atinge toda a União Europeia.

O estudo, para além de determinar a percentagem de inquiridos vítimas de erros em medicina, avaliou, igualmente, o nível de receio que os europeus têm do erro.

A Letónia foi o país onde se verificou a maior percentagem de receio (83% dos inquiridos) e a Áustria o país onde se verificou a menor (17% dos inquiridos).

Estas estatísticas são um espelho da realidade, uma vez que em ambos os países foi verificada a maior e a menor taxa de pessoas vítimas de erros médicos.

Observou-se, também, que as mulheres, as pessoas de idade e as menos escolarizadas são os grupos mais receosos.

No total, 23% dos inquiridos declararam que num dado momento "conheceram um ou outro tipo de erro médico". Porém, de uma forma aparentemente incoerente, a maioria dos inquiridos confia nos profissionais de saúde do seu país.

O erro médico em Portugal

O mesmo estudo demonstrou que os portugueses se preocupam muito com este tema, uma vez que 77% dos inquiridos considera os erros médicos um problema para o país – preocupação superada apenas pelos italianos e polacos, com uma percentagem de 97% e 91%, respectivamente.

Do estudo apurou-se ainda que metade dos portugueses inquiridos tem receio de ser vítima de um erro médico e 59% está mesmo convicto de que é provável que venha a ser vítima de "erro grave".

Em termos reais, 16% dos inquiridos já sofreu um erro ou conheceu alguém que teve essa experiência. Para além do mais, um em cada dez declarou já ter sofrido "um engano médico grave devido à prescrição de um medicamento".

Porém, tal como no resto da Europa, 67% dos inquiridos tem confiança nos profissionais de saúde.

Um especialista nesta área, Luís Martins, professor no ISCTE e co-autor do livro "O Erro em Medicina – Perspectivas do Indivíduo, da Organização e da Sociedade", o erro médico é a ponta do iceberg de uma gestão hospitalar desadequada.

Opinião esta apoiada pelo ex-bastonário da Ordem dos Médicos, Germano de Sousa, e pela comunidade científica em geral, pois, esses erros são "muitas vezes consequência da própria estrutura organizacional".

No último século o mundo presenciou várias mudanças e a área da medicina não foi excepção. Passou-se de uma medicina restringida à relação hipocrática médico-doente para uma medicina de prestação de cuidados de saúde realizados por humanos inseridos em estruturas complexas e que operam com equipamentos sofisticados; passou-se de uma medicina precária para uma medicina cada vez mais iluminada, mas mais incerta e volátil, potenciando a margem para erros.

Todos defendem que "o ideal é não haver erro nenhum" e caminha-se nesse sentido, no sentido da identificação das falhas, no sentido da prevenção das mesmas.

Deste modo, desde as instituições até às unidades hospitalares, passando pelo próprio utente, todos estão cada vez mais atentos e a trabalhar para minimizar a margem do erro.

Prevenção do erro

O sector da Saúde precisa de usar todos os instrumentos à sua disposição, para minimizar os riscos de erros médicos com lesão corporal.

Imersos na sua tarefa diária de salvar vidas, os profissionais da saúde não se apercebem da profusão de leis, códigos e normas que têm vindo a ameaçar o seu histórico sacerdócio.

A tradicional e boa relação de confiança médico/paciente, tem vindo a alterar-se paulatinamente em proporção inversa aos direitos que têm vindo a ser assegurados aos utentes da saúde, pelo código de defesa do consumidor.

Prevendo-se uma tendência para o incremento do rigor legislativo na "defesa do consumidor/cliente da saúde", cabe às instituições hospitalares, laboratórios, clínicas, médicos e demais profissionais da saúde tomarem todas as precauções possíveis para salvaguardar o bom nome e a credibilidade das instituições, e aos médicos, inteirarem-se das suas prerrogativas em caso de terem de enfrentar a justiça e estabelecendo uma eficiente estratégia de defesa do direito médico, para que assim se preserve, em moldes actuais, a relação hipocrática médico-doente.

Autor:
Tupam Editores

Última revisão:
09 de Abril de 2024

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