PSICOLOGIA

Estudo apresenta medidas para lidar melhor com o luto na pandemia

Um estudo do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) alerta para as dificuldades de quem perde um ente querido, no contexto da pandemia de COVID-19, e apresenta medidas para lidar melhor com o luto nesta nova fase, destaca um artigo publicado na página de notícia da instituição de ensino na internet.

Estudo apresenta medidas para lidar melhor com o luto na pandemia

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Um artigo assinado por investigadoras do ISPUP, publicado na revista Acta Médica Portuguesa, apresenta sugestões às atuais práticas vigentes no processo de identificação do corpo e em cerimónias fúnebres, marcadas por muitas restrições, em Portugal. O objetivo é facilitar a recuperação de quem vivencia o luto e evitar o agravamento de problemas de saúde mental.

De acordo com Ana Aguiar, primeira autora do trabalho, “as estratégias implementadas durante o período de confinamento obrigatório para combater a propagação da COVID-19 alteraram os rituais fúnebres e a forma como vivenciamos o luto”.

“Se, por um lado, é fundamental controlar a proliferação da pandemia, por outro, a imposição dessas medidas veio dificultar o cumprimento dos rituais convencionais de despedida por parte de familiares, amigos, colegas, vizinhos e outros”, sublinham as investigadoras.

De 1 de março a 10 de maio, 1135 óbitos registados em Portugal tiveram o novo coronavírus como causa de morte. Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde (DGS) emitiu uma norma, logo no início da pandemia, sobre cuidados post mortem. Note-se que, “apesar de a regulamentação ter evoluído desde a data de submissão do artigo, sendo agora mais específica, o problema que aqui é apresentado pode persistir”, refere Ana Aguiar.

Segundo as orientações da DGS, caso um indivíduo morra com suspeita ou confirmação de infeção por SARS-CoV-2/COVID-19, a família é impedida de ver o corpo. A identificação do cadáver é realizada por via remota, geralmente por uma agência funerária, que o faz através de fotografias digitais. O cadáver é colocado num saco impermeável, despido, e o caixão permanece fechado durante o funeral.

“Apesar de a norma da DGS ter sido pensada para os óbitos com infeção suspeita ou confirmada por SARS-CoV-2, a grande maioria das pessoas que morreu devido a outras doenças ou de causa natural foi submetida a este procedimento e os familiares impedidos de contactar com o corpo do falecido e de vivenciar o luto de forma adequada. Tal não deveria acontecer”, aponta a investigadora do ISPUP.

Tendo em conta o impacto que estas restrições podem ter na saúde mental dos familiares e das pessoas mais próximas dos falecidos, o artigo apresenta algumas recomendações que pretendem tornar as medidas de proteção contra a COVID-19, em contexto post mortem, mais abrangentes e humanas.

Em primeiro lugar, as autoras defendem a prestação de apoio psicológico a todos os que perderam ou possam vir a perder um familiar ou amigo neste contexto de grandes restrições e de distanciamento.

“É fundamental que existam equipas de psicólogos disponíveis para auxiliar, tanto presencial, como remotamente, as pessoas que perderam um ente querido e que necessitam de ajuda para superar a perda. A criação de uma linha gratuita de apoio ao luto poderia ser considerada”, mencionam.

A informação sobre os serviços de apoio psicológico seria facultada nos hospitais e no Instituto de Medicina Legal, o que exige um trabalho de equipa entre a classe médica e os profissionais de psicologia.

Outra proposta passa pela alteração dos atuais procedimentos de identificação e de preparação do corpo para as cerimónias fúnebres. O artigo recomenda que o reconhecimento do cadáver seja feito pelos familiares e não pelas agências funerárias ou através de fotografias, quer se trate ou não de uma morte relacionada com a COVID-19.

Principalmente quando a causa de morte não está associada a um diagnóstico de COVID-19, considera-se que a identificação do corpo deve ser presencial (embora restrita ao menor intervalo possível de tempo) e que o equipamento de proteção individual deve ser assegurado, de forma a permitir “que as pessoas se possam despedir convenientemente da pessoa falecida, uma última vez”.

Levando em consideração a importância que as crenças espirituais ou religiosas podem assumir numa situação de experiência de luto e de angústia, é sugerida a criação de uma linha de apoio para esse fim, que poderia ser dada a conhecer, através dos cuidados de saúde primários, hospitais e meios de comunicação social.

Por fim, salienta-se a necessidade de acautelar a presença de familiares e de amigos nas cerimónias fúnebres, independentemente da causa da morte, por se tratar de um momento de despedida crucial para o processo de recuperação.

No início da pandemia, o número de pessoas (incluindo familiares) que podia comparecer nos funerais era bastante restrito. Mas, desde o dia 4 de maio, e de acordo com o calendário de reabertura aprovado pelo Conselho de Ministros (a 30 de abril), esse número foi alargado, sendo as autarquias locais as entidades responsáveis pela definição do limite máximo de pessoas por funeral.

No entanto, caso seja necessário voltar a adotar medidas mais restritivas, importa garantir a presença dos familiares e amigos nos velórios e funerais, destaca o artigo.

“Não há risco conhecido de infeção por se estar no mesmo espaço de alguém que morreu devido à COVID-19. Apesar de a doença poder ser transmitida entre quem está no funeral, o contágio pode ser evitado através do recurso a medidas de prevenção que todos já conhecemos e que são adotadas em outros eventos: o distanciamento físico, a lavagem frequente das mãos, o cumprimento das regras de etiqueta respiratória e o uso de máscara facial”, frisa Ana Aguiar.

Dado que vamos continuar a viver com a pandemia, o artigo pretende chamar a atenção para a necessidade de preservar o mais possível a vivência do luto neste contexto. Da mesma forma, pretende-se contribuir para que alguns procedimentos possam ser melhorados no futuro.

“É necessário apostar em medidas que ajudem as pessoas a viverem o luto. Os problemas de saúde mental não podem ser negligenciados ou marginalizados. Trata-se de uma questão de saúde pública”, conclui.


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